quinta-feira, julho 16, 2009

O desenvolvimento: entre seus beneficiários e suas vítimas

Por: Leonardo Boff

Ricos lamentam as perdas e pobres denunciam a miséria

Nos inícios do ano, os 20 países mais ricos do mundo (G-20) se reuniram em Londres para encontrar saídas à crise mundial. A decisão foi continuar no mesmo caminho anterior à crise, mas com controles e regulações a partir de uma presença maior do Estado na economia. Os controles seriam pelo tempo necessário à superação da crise, a fim de evitar o colapso global, e as regulações para restaurar o crescimento teriam a mesma lógica de antes.

Essa opção implica continuar com a exploração dos recursos naturais que devastam os ecossistemas e fazem aumentar o aquecimento global e o fosso entre ricos e pobres. Se isso prosperar, dentro de pouco tempo enfrentaremos crise de mesma natureza, pois as causas não foram eliminadas. Os restantes 172 países sequer foram consultados. Pensou-se em ajudá-los, mas com migalhas. Toda a África, o continente mais vulnerável, seria socorrida com menos fundos que o governo dos Estados Unidos aplicou para salvar a General Motors.

O impacto perverso da crise sobre os países de baixo ingresso apresenta-se aterrador. Estima-se que, enquanto durar a crise, mais de 100 milhões de pessoas caiam anualmente na extrema pobreza e 1 milhão de postos de trabalho se perderão por mês. Tal fato fez com que o presidente da Assembleia Geral da ONU, Miguel d’Escoto Brockmann, imbuído de sentido humanitário e ético, convocasse uma reunião com os 192 representantes dos povos para, juntos, discutirem a crise e buscarem soluções includentes. Isso ocorreu dias 24 a 26 de junho. Todos falaram. Era impactante ouvir o clamor que vinha da humanidade: os ricos lamentando os trilhões em perdas nos negócios e os pobres denunciando o aumento da miséria de seu povo.

Muitas vozes soaram claras: não bastam controles e regulações que acabam beneficiando os que provocaram a crise. Faz-se urgente um novo paradigma que redefina a relação com a natureza, o crescimento e o tipo de civilização planetária que queremos. Importa elaborar uma Declaração do Bem Comum da Humanidade e da Terra que oriente ética e espiritualmente o sentido da vida.

Depois de intenso trabalho de uma comissão de expertos presidida pelo Nobel de economia Joseph Stiglitz, e com as colaborações vindas de quatro mesas redondas e da Assembleia Geral, concertou-se um documento que ganhou o consenso dos 192 representantes dos povos. O perigo coletivo facilitou uma convergência coletiva rara.

O documento prevê medidas imediatas para salvar os mais vulneráveis. Mas o mais importante é a apresentação de um programa de reformas que prevê um sistema mundial de reservas com direitos especiais de giro, reformas de gestão do FMI e do Banco Mundial, regulações internacionais dos mercados financeiros e do comércio de derivados e criação de um Conselho de Coordenação Econômica Mundial equivalente ao Conselho de Segurança.

Essa cúpula mundial é geradora de esperança, pois a humanidade começa a olhar para si como um todo com um destino comum. Mas todas as soluções se orientam ainda sob o signo do desenvolvimento, o fator principal da crise do sistema Terra. Ele tem que ser trocado por um "modo sustentado de viver", caso contrário assistiremos à bifurcação da humanidade entre os que desfrutam do desenvolvimento e os que são vítimas dele.

O futuro próximo, dizia o presidente da Assembleia, será pela utopia necessária que precisamos construir para permanecermos juntos na mesma Casa Comum.

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